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mas hoje para que serve o latim?
Costumo
dizer que isso não é pergunta que se faça, mas já que é feita,
perguntas são para ser respondidas. Em nosso século, em que imperam
a eletricidade e a velocidade, parece de fato estranho e até
anacrônico, à primeira vista, o estudo do latim.
Qual
a utilidade de uma língua morta, que requer atenção, dedicação e
esforço? Em que isso vai ajudar a mudar minha vida, fazendo-me
galgar posições mais elevadas da sociedade? Tudo depende de como se
encara o problema. Com o latim aprenderemos a compreender melhor o
nosso idioma, que contém mistérios interessantíssimos.
O
latim serve-nos de trampolim para mergulhos mais profundos na nossa
visão de mundo, no nosso modo de pensar, na nossa vida. Aquele que
entende bem a mensagem que o latim passa em seus textos se
questionará melhor e verá que antes de nossos valores, havia
outros, muito distintos, mas perfeitamente coerentes, que merecem
nossa admiração e respeito.
Longe
de ser retrógrado, o estudo do latim associado ao estudo da vida
social em Roma nos faz vislumbrar quanta coisa mudou e quanta coisa
ainda continua surpreendentemente do mesmo jeito que era, muitas
vezes apenas com os nomes trocados. Sim, porque o que se herdou do
Império Romano ao longo desses vinte e sete séculos de uso do latim
escrito não foi pouco. Resumindo, eu responderia à pergunta do
título com uma outra pergunta: por que não estudar o latim?
Além
disso, de língua morta o latim não tem nada. Vejam, por exemplo,
quantas expressões são usadas em Direito. Quem nunca ouviu falar de
habeas corpus? de alibi? De data venia? O latim
não está de forma alguma morto, está no nosso dia-a-dia: quem
nunca mandou um curriculum vitae? Quem nunca ouviu falar de
renda per capita? Ou pensou em fazer uma pós-graduação lato
sensu? Ou ouviu que alguém é doutor honoris causa? Quem
nunca fez um P.S. ao fim de uma carta? Ora, isso também é
latim: post scriptum. Essa antiga língua de Roma está nas
tecnologias mais modernas, está na fecundação in vitro, nas
invenções mais recentes: está, por exemplo, no fax (abreviação
de fac simile, que significa “faça de maneira semelhante”,
não é isso que faz o fax?). Mesmo muitas palavras importadas
do inglês remontam ao latim: na Informática usa-se o verbo deletar,
do inglês to delete, que vem, por sua vez, do verbo deleo
em latim, que significa “destruir”. De tão entranhado na
nossa língua, o latim até se confunde com ela: idem é
latim, a expressão grosso modo também (por isso, é errado
dizer “a grosso modo”), o supra summum, o et caetera,
até a expressão vulgo, quando dizemos José Carlos vulgo
Zeca. E há muito, muito mais: expressões como a priori,
alter ego, causa mortis, ex libris, exempli gratia, Homo sapiens, in
continenti, in loco, ipsis litteris, lapsus linguae, modus vivendi,
mutatis mutandis, pari passu, persona non grata, ad hoc, sine qua
non, scilicet, sic, status quo, carpe diem, sui generis, ab imo
pectore, tabula rasa, vade mecum, vade retro, Aedes aegypti, só
para citar as mais comuns, dão um sabor todo especial à redação
de um texto e ¾ por que não? ¾ à fala, sem falar de provérbios
como alea jacta est, cogito ergo sum, mens sana in corpore sano.
Portanto,
aprender ou não o latim não é a questão. Ele já convive conosco,
pois é a alma de nossa língua e bastaria reconhecê-la. Com o
latim, vemos que as irregularidades e as temíveis exceções das
gramáticas não são nem irregulares, tão pouco exceções. Tudo
passa a ter uma lógica mais clara e previsível. Se já conhecemos
bastante latim, por que não saber mais? Ampliando ou aprimorando
nosso vocabulário, não nos destacamos? Está respondida a pergunta
daquele que quer mudar sua posição social.
Mário
Eduardo VIARO (USP), Publicado na Revista de ciências humanas e
sociais, São Paulo, Unisa, v. 1, n. 1, p. 7-12, 1999.
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